A ornamentação de ruas e da Praça Matriz, para a celebração da Festa de Corpus Christi, ganha vida e cores com a tradicional elaboração dos tapetes devocionais.
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“Pó de serragem, farinha de trigo, tapioca vencida, terra de todas as cores, areia, folhas e plantas” eram os materiais normalmente utilizados para a confecção dos tapetes devocionais, patrimônio imaterial da cultura de Caculé e região. [11]
“Antigamente os desenhos eram feitos à mão livre, sugeridos por pessoas como minha avó, Dona Odília Santos Ribeiro, que ajudou por mais de 30 anos.” [11]
Atualmente são usados desenhos prontos e pó de serragem coloridos.
Os tapetes eram feitos nas ruas onde a procissão passava (começando umas 3 horas antes da procissão ou da missa), geralmente na Av. Cônego Miguel Monteiro, desde o Posto W3 até a Praça da Igreja Matriz.
Aproximadamente 20 pessoas, moradores da rua, faziam os tapetes, outras orientavam e muitas pessoas assistiam nos passeios. [11]
” Minha avó – Dona Odília – emprestava um terço enorme, de 2 metros, para montar no chão. O povo armava altar com santos, vasos de flores, tapetes caros, castiçais caros, velas caras, imagens de santos…Muito lindo! ” [11]
O trabalho era dividido em grupos. “Cada grupo ficava encarregado de arrumar as frentes de suas casas. Eu como sempre fui elétrica, ia subindo a avenida ajudando, dando palpites, para não repetir desenhos.” [11]
Somente o padre pisava nos desenhos, os fiés evitavam.
Atualmente o percurso é menor, ficando mais próximo da Igreja Matriz; uma das razões foram algumas quedas e acidentes com pessoas de idade.
“Os tapetes são uma verdadeira intervenção urbana que agrega e mobiliza a comunidade. A arte dos tapetes não tem limites, pois envolve artistas, não artistas, moradores da rua por onde passa o cortejo e colaboradores” segundo Cézar Teixeira, Chefe de Gabinete da Fundação de Arte de Ouro Preto (FAOP) [2]
Uma beleza construída com detalhes para uma vida breve, que se desfaz após a passagem da procissão. Talvez seja justamente por ser uma obra de arte efêmera que não pode ser dobrada nem guardada que atrai tanto a atenção de turistas, moradores e fotógrafos. É preciso captar tudo com olhar atento a todo tipo de detalhe. E o que importa mesmo é o processo de construção do tapete, a união de um povo — com um mesmo propósito de confeccionar sentidos e fé — que contribui para a manter a tradição. “Encanto aos olhos, tradição da cidade, história que faz parte do patrimônio, poéticas que são construídas. Uma intervenção artística e urbana que traduz essa relação com a fé”, completa Cézar. [2]
Os tapetes de serragem têm sido, nas cidades de origem paroquial católica, uma expressão coletiva artesanal associada a cortejos em via pública. …. os tapetes de serragem têm grande notabilidade na Semana Santa e manifestam-se como desenho em três distintas escalas –a do bairro, a da rua e a da casa– implicando em sentidos diversos para a memória coletiva e a divisão social do trabalho. A observação de sua execução permite perceber as ressignificações dessa tradição. Pode-se avaliar os princípios, técnicas e materiais utilizados, o que aponta para um saber que se incorpora como patrimônio imaterial da
comunidade. [1]
O tapete de serragem é típico, no Brasil, das festas de Semana Santa, Corpus Christi e daquelas dedicadas aos santos padroeiros. Pressupõe-se haver, nas cidades em que comparece, uma forte religiosidade. [1]
O tapete desperta interesse para investigação para além de seus aspectos iconográficos, presentes em toda sua extensão; ou cenográficos, por compor ambiência própria para um rito espetacularizado, ao longo das ruas perfiladas; mas também por manifestar maneiras de produção espacial que utilizam modos próprios de repropor momentaneamente a própria espacialidade da cidade, espacialmente mediante uma atividade coletiva de desenho. [1]
A Religiosidade do Momento:
A SEMANA SANTA
Toda a Quaresma nos prepara para celebrar com as disposições necessárias a Semana Santa. Ela se inicia com a celebração da Entrada de Jesus em Jerusalém, o Domingo de Ramos. O povo simples e fervoroso aclama Jesus como Salvador.
O Domingo de Ramos é conhecido pela bênção de ramos de árvores e a aspersão da água benta.
Os ramos significam a vitória: “Hosana ao Filho de Davi; bendito seja o que vem em nome do Senhor, o Rei de Israel; hosana nas alturas”. Levados para as nossas casas, os ramos lembram-nos de que estamos unidos a Cristo no nosso caminho de calvário, mas que chegaremos à Ressurreição. Amém!
Na Missa dos Santos Óleos a Igreja celebra a Instituição do Sacramento da Ordem e a bênção dos santos óleos do Batismo, da Crisma e da Unção dos Enfermos. Na Missa do Lava-pés, na noite da Quinta-feira Santa, a Igreja celebra a Última Ceia de Jesus com os Apóstolos onde Ele instituiu a Sagrada Eucaristia e deu suas últimas orientações aos Apóstolos.
Na Sexta-Feira Santa a Igreja guarda o grande silêncio diante da celebração da morte do seu Senhor. Às três horas da tarde é celebrada a Paixão e Morte do Senhor. Em seguida, a Procissão do Senhor Morto por cada um de nós. Cristo não está morto, e nem morre outra vez, mas celebrar a sua Morte é participar dos frutos da Redenção.
Na Vigília Pascal a Igreja canta o “Exultet”, o canto da Páscoa, a celebração da Ressurreição do Senhor que venceu a morte, a dor, o inferno, o pecado. É o canto da Vitória.
Celebrar a Semana Santa é celebrar a vida, a vitória para sempre. É recomeçar uma vida nova, longe do pecado e em comunhão mais íntima com Deus. Esta é a Semana Santa que o mundo precisa celebrar para vencer seus males, suas tristezas, suas desesperanças.
Prof. Felipe Aquino [10]
FESTA DE CORPUS CHRISTI
” A Festa de “Corpus Christi” é a celebração em que solenemente a Igreja comemora o Santíssimo Sacramento da Eucaristia; sendo o único dia do ano que o Santíssimo Sacramento sai em procissão às nossas ruas. Nesta festa os fiéis agradecem e louvam a Deus pelo inestimável dom da Eucaristia, na qual o próprio Senhor se faz presente como alimento e remédio de nossa alma. A Eucaristia é fonte e centro de toda a vida cristã. Nela está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, o próprio Cristo.
A Festa de Corpus Christi é celebrada na primeira quinta-feira após o domingo da Santíssima Trindade.
Todo católico deve participar dessa Procissão por ser a mais importante de todas que acontecem durante o ano, pois é a única onde o próprio Senhor sai às ruas para abençoar as pessoas, as famílias e a cidade. Em muitos lugares criou-se o belo costume de enfeitar as casas com oratórios e flores e as ruas com tapetes ornamentados, tudo em honra do Senhor que vem visitar o seu povo.
Prof. Felipe Aquino ” [10]
História dos Tapetes no Brasil :
Sua confecção teve origem em Portugal e chegou ao Brasil com os imigrantes lusitanos, durante o período colonial. Aqui a técnica foi enriquecida pelo barroco.
Mariana, primeira capital de Minas Gerais, logo adotou o costume. Em 1745, por ordem de Dom João V, a região foi elevada à cidade (a primeira de Minas) e teve Dom Frei Manoel da Cruz nomeado como bispo (também o primeiro de Minas), o que aumentou sua população católica. Em 15 de outubro de 1748, Dom Frei Manuel entrou com todas as pompas em Mariana, iniciando uma das maiores festas realizadas na Capitania das Minas, o Áureo Trono Episcopal. “Foi nesta época que a população começou a se unir para confeccionar os famosos tapetes enfeitam as ruas do centro histórico da cidade”, relata Marcílio Vieira Queiroz, secretário de Cultura e Turismo de Mariana. [3]
Fazer tapetes em ocasiões festivas chegou a nós por uma tradição européia, desde os cortejos triunfais romanos. Mas a relação de festivais religiosos com decoração urbana e práticas espetaculares está presente também no hinduísmo e em outras crenças. No barroco brasileiro esse caráter teve enorme expressividade. [5]
Para o historiador do Iepha/MG, Francisco Mendonça Júnior, as comemorações religiosas pautam a organização das comunidades de forma que sua rotina passa a girar muito em torno destes eventos. Ele explica com a ideia de que haveria uma espécie de calendário sagrado, ou religioso, atuando paralelamente ao oficial (ou profano, ligado ao cotidiano). “Essas festividades religiosas marcam um momento em que as atenções são voltadas quase totalmente à devoção e ao reencontro das comunidades. É a hora eleita por aqueles membros que foram morar em outros locais para retornar e celebrar uma fé coletiva. Comemorações religiosas têm esse poder de vincular as pessoas e reforçar mecanismos de pertencimento em uma comunidade, mesmo que não haja a convivência cotidiana”, explica o historiador. [4]
Tapetes de serragem com a representação de imagens sacras é uma tradição da Semana Santa. Uuma oficina realizada pelo artista plástico de Ouro Preto, Rodrigo Câmara, mostrou o costume para as crianças e os adultos no bairro Santa Teresa, em Belo Horizonte:
” Após a Sexta-Feira da Paixão … , o sábado tem sabor de interlúdio para meditação.
É na madrugada entre o sábado e o domingo, Shabat ressignificado, que se localiza o objeto/evento de nosso interesse; é quando as intenções da comunidade se voltarão para, num ato de fé, esperar pela ressurreição do Senhor até o amanhecer, dedicando a noite à execução do tapete, e reservando o domingo ao descanso.
Interessa muito verificar se, pela maneira como é construído e usado, o tapete possa fazer emergirem memórias sobre a cidade, na forma de antigas relações de apropriação do espaço, mediante a performance coletiva.
Por exemplo, fazendo reascender papéis sociais –e suas relações de localidade afetual (BIÃO), de topofilia (TUAN)– que pareciam desaparecidos, tendo sido apenas silenciadas
no cotidiano. Visto que a própria construção do tapete, ato festivo durante a madrugada, ocorre de maneira socialmente acordada e constitui em si um espetáculo, é esperado que ele atue como um meio de atualização de memórias:
“la performance también funciona como una epistemología, como un modo de comprender, como um conocimiento” (TAYLOR, 2003).
Várias maneiras diferentes são empregadas na criação do tapete, o que em si constitui espetáculo admirável, e motivam a uma urgente taxonomia da técnica, em razão da constante introdução de novos materiais e seus procedimentos de trabalho mais favoráveis (como borrachas coloridas, papéis laminados metalizados etc.), o que significa que a tradição está se atualizando.
De fato, o próprio uso da serragem já representou uma introdução, pois a apenas 40 anos o uso corrente era de folhagens e flores. O vibrante colorido se deve à presença ainda mais recente de anilinas sintéticas, outro avanço rapidamente incorporado em substituição à parca paleta obtida antes pelo uso do pó Xadrez. Por sua vez, o escasseamento de madeiras de cerne claro, mais dóceis ao corte e preferidas pela indústria moveleira, indica que os matizes de vermelho ganharão cada vez mais espaço diante dos amarelos. Em compensação, o azul tem ótima representação por meio da raspa de couro, mas esta comparece em quantidades menos expressivas que o subproduto do trabalho das serrarias.” [6]
Videos de tapetes pelo Brasil:
Fontes:
[1] artigo TAPETE DE SERRAGEM DA SEMANA SANTA EM OURO PRETO:
DESENHOS, ESCALAS E SIGNIFICADOS – autor: Esequias Souza de Freitas –
IFBA-Instituto Federal de Educação da Bahia – http://wright.ava.ufsc.br/~grupohipermidia/graphica2013/trabalhos/TAPETE%20DE%20SERRAGEM%20DA%20SEMANA%20SANTA%20EM%20OURO%20PRETO%20DESENHOS%20ESCALAS%20E%20SIGNIFICADOS.pdf – acessado em 19.3.32016
[2] http://revistasagarana.com.br/paixao-e-fe/ – acessado em 22.3.2016
[3] site do IPHEA / MG – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – DEVOÇÃO DE FÉ CRISTÃ NOS TAPETES DE SERRAGEM – http://www.iepha.mg.gov.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=637 – acessado em 21.3.2016
[4] site do IPHEA / MG – FÉ E CULTURA POPULAR NA SEMANA SANTA – http://www.iepha.mg.gov.br/banco-de-noticias/793-iephamg-apresenta-fe-e-cultura-popular-na-semana-santa – acessado em 20.3.2016
[5] artigo TAPETE DE SERRAGEM DA SEMANA SANTA: ASPECTOS DESENHÍSTICOS
DE UMA TRADIÇÃO DA CIDADE DE OURO PRETO – autor: Esequias Souza de Freitas
Especialista, UEFS – Universidade Estadual de Feira de Santana-BA – http://www.unicamp.br/chaa/eha/atas/2008/DE%20FREITAS,%20Esequias%20Souza%20-%20IVEHA.pdf – acessado em 22.3.2016
[6] transcrição do artigo TAPETE DE SERRAGEM DA SEMANA SANTA: ASPECTOS DESENHÍSTICOS DE UMA TRADIÇÃO DA CIDADE DE OURO PRETO – autor: Esequias Souza de Freitas Especialista, UEFS – Universidade Estadual de Feira de Santana-BA – http://www.unicamp.br/chaa/eha/atas/2008/DE%20FREITAS,%20Esequias%20Souza%20-%20IVEHA.pdf – acessado em 22.3.2016
[7] trabalho: Paisagem Cultural do Itinerário dos Tapetes de Serragem da Semana Santa – autor: Esequias Souza de Freitas – http://www.forumpatrimonio.com.br/paisagem2014/artigos/pdf/106.pdf – acessado em 22.3.2016
[8] artigo DO ENCONTRO DE DIFERENTES A UMA FESTA DE IGUAIS: UMA ANÁLISE DA SOCIEDADE PORTUGUESA NAS FESTAS ENTRE OS SÉCULOS XV E XX – autor: Pedro Henrique Victorasso – Mestrando em História – UNESP – http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/oficinadohistoriador/article/viewFile/15004/11579 – acessado em 22.3.2016
[9] página do Diário do Sisal – http://www.diariodosisal.com.br/pg-noticia.php?id=11605&cat=24&sub=171&dest=9 – acessada em 22.3.2016
[10] página da Paróquia Sagrado Coração de Jesus de Caculé – https://scjcacule.wordpress.com/ – acessado em 23.3.2016
[11] entrevista com Solange Graia, em 22.3.2016